quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

«Nunca houve esta hora, nem esta luz...»



Em noites de insónia erro pelas ruas nocturnas de Lisboa à procura de lume que alimente o meu sonhar. Mas na cidade adormecida tudo descansa em quietude: ninguém que se mova pelas ruas, as luzes apagadas, o imperador-silêncio. Nos vazios que se abrem entre as frontarias o rio corre cheio e delicado silenciosamente. Em passos perdidos, cego a tudo o que me rodeia, deixo a minha imaginação dar uma dimensão-outra à escuridão. Sombras dançantes, informes impressões, vislumbres fugitivos, gestos vacilantes tementes de uma existência metafísica.

A noite mergulhada num mar de escuridão silenciosa e sem ondas, é inesperadamente sacudida pelo clarão cru de um candeeiro de rua que tinge o basalto dormente em tons acobreados. A luz dá às minhas sombras proporções menos assustadoras. Agora, mais calmo e sossegado, consigo contemplar as casas de uma brancura de ossadas sob o luar e espreitar o Tejo absorvendo todas as correntes até se tornarem uma única no mar. Ao olhar os telhados vejo os encadeamentos invisíveis, o traço essencial de uma expressão de bonomia.

Sobressalto, abro os olhos e desperto. Os primeiros pálidos alvores da madrugada começam a romper por entre as portadas da minha janela. Debruçando-me para espreitar pelos vidros como se procurasse a cidade fugida fico cego pela luz diáfana que se espalha pelo horizonte. Num cansaço de pálpebras suspiro e evoco a cidade que vive no meu quarto. E o rio, ali, atrás daquela parede...


a.r.T.

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