
Vejo a minha própria alma projectar-se para fora do meu corpo e embarcar num estado de violência e loucura. Uma verdadeira besta nasce dentro de mim e converte-me a fazer coisas cruéis. Esmagar ossos, furar olhos, arrancar unhas, cuspir na cara de alguém, puxar cabelos. Ah, apetece-me espancar, lutar, empurrar, gritar sem descanso nem piedade!
Eu tento anulá-lo, mas ele subsiste, não sei explicar como, feito de matéria persistente que cresce à minha volta e me envolve, vestindo-me de escuridão da cabeça aos pés, com uma sombra em vez de cara. A alma vazia de bondade e compaixão, o rosto marcado de horrores indizíveis e um sorriso da mais pura perversão. Despe-me de todo e qualquer apetrecho de nobreza ou pureza.
Depois, aos poucos, desaparece e sou trazido de novo à vida que preferia não ter deixado, as sensações acalmam-se, a razão toma lugar e acabo por descobrir que aquilo que verdadeiramente habita em mim me desola, me envergonha e me assusta.
a.r.T.